sexta-feira, 17 de março de 2017

APA da Escarpa Devoniana – uma lição de vida

Publicado no Diário dos Campos em 18/03/2017.

Na sexta-feira dia 10 de março, tivemos no Cine Teatro Ópera em Ponta Grossa uma reunião histórica. Por iniciativa de deputados da Assembleia Legislativa do Paraná, foi convocada audiência pública para discussão de nefasto projeto de lei que reduz drasticamente a APA – Área de Proteção Ambiental – da Escarpa Devoniana.
O teatro ficou lotado, e fora dele, impedidos de entrar, centenas de pessoas protestaram, ao longo de toda aquela manhã, pois queriam ter também direito de participação e manifestação na audiência. A maioria destes que ficaram para fora era de alunos e professores de universidades e escolas de ensino básico da cidade. A maioria daqueles que estavam dentro do teatro era de proprietários rurais e seus funcionários, que chegaram bem cedo de Jaguariaíva, Piraí do Sul, Itaiacoca e outros locais, trazidos por ônibus fretados para tal finalidade, e logo ocuparam as dependências do teatro.
Resumindo, os que estavam dentro na sua maioria apoiavam a redução da APA, os que estavam fora em sua maioria refutavam a redução. E os alunos gritavam este repúdio, e pediam nova audiência, o que era escutado lá dentro até mesmo pelos que estavam na mesa de direção dos trabalhos. Demonstravam inconformismo não só com o despropósito do projeto de lei, mas também com as estratégias que foram empregadas justamente com a finalidade de deixar de fora os que eram contrários a ele.
Nada de novo, estas são as usuais estratégias do patrimonialismo que não mede esforços para fazer prevalecer seus interesses: mobilização de logística para trazer os trabalhadores rurais num horário muito cedo; escolha de um local para ser preenchido por esses trabalhadores, excluindo outros interessados; direção da audiência por um deputado parcial, nitidamente identificado com os interesses dos ruralistas; implacável segurança para facilitar que o teatro pudesse ser ocupado pelos que tiveram condições de chegar muito mais cedo, excluindo da audiência os contrários à redução da APA; encerramento da reunião muito antes do previsto, de modo que o público não pôde fazer perguntas ou questionamentos. Por muitos a reunião não foi considerada uma verdadeira audiência, pois não permitiu o debate.
Mas nada disso impediu que o encontro fosse histórico. Pelo número de pessoas que reuniu, dentro e fora do teatro, pelos gritos de inconformismo, pela repercussão na mídia. Hoje muito mais gente sabe o que é a APA, uma área protegida mantenedora das condições de sustentação da vida saudável na região, e qual sua finalidade, ambiental, social e econômica. E muito mais gente sabe quem é quem, e quais comportamentos os proprietários rurais se permitem para alcançar seus interesses.
Mas nesta lição de vida que foi a audiência, há que se destacar algo notável: a infeliz declaração de um deputado, justamente quem presidia a audiência. Ele pronunciou-se na mesa e nos órgãos de comunicação afirmando que quem estava reivindicando voz na parte de fora do teatro eram alunos baderneiros, e que eles deveriam estar em sala de aula nas escolas e não gazeando e bagunçando na audiência no teatro.
Que tacanha concepção do que seja o ensino! E que triste manifestação de um membro do legislativo! Se bem que todos saibam qual é o setor da sociedade que este deputado está representando. E por isso mesmo, se vivêssemos uma sociedade democrática, ele nunca deveria ter sido o indicado para presidir a audiência.
Será que só os professores entendem que a melhor aula de sustentabilidade, civismo e cidadania que nossos jovens poderiam ter seria justamente a participação numa audiência como aquela, uma oportunidade rara?
Mas com sua atitude, o deputado deu uma significativa contribuição para demonstrar como pensam e agem alguns de nossos legisladores. Talvez tenhamos que agradecê-lo, pois ele nos esclarece como deveremos utilizar nossos votos na próxima eleição.

3 comentários:

  1. Mário,
    Mando boas energias para continuar na luta...da defesa do meio ambiente e da voz ativa!
    Abraços
    Gláucia

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  2. Infelizmente parece que a maioria dos políticos pensa assim. Alunos com capacidade crítica e consciência são um perigo para a Nação.

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  3. Que bom que existem pessoas que lutam justamente contra esse pensamento tacanha. E você é uma delas! Tenho muito orgulho disso!
    As coisas vão mudar. Cedo ou tarde, elas vão! E os estudantes que ficaram pro lado de fora vão ser os que estarão mais por dentro!

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